Ciências Sociais Articuladas – Emendas e Orçamento

Postado por OLB em 25/03/21

1. Apresentação

Este é o primeiro relatório do Observatório do Legislativo Brasileiro (OLB) com o objetivo de monitorar o Congresso Nacional nos temas de educação superior e Ciência & Tecnologia, e produzir análises pautadas em conhecimento especializado e dados do processo legislativo.

Com base na Lei de Orçamento Anual para 2021, analisamos as emendas ao orçamento propostas por parlamentares e bancadas no âmbito da Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização (CMO) do Congresso Nacional. São três os objetivos principais de nossa análise aqui:

  1. analisar a evolução do investimento em ensino superior e pesquisa científica no Brasil nos últimos anos;
  2. avaliar o peso do setor no orçamento público, em geral, e nas emendas parlamentares, em particular;
  3. iniciar o mapeamento de atores relevantes nas matérias de interesse, tendo em vista seu engajamento na formação do orçamento público.

Em razão do estágio atual de tramitação do orçamento federal de 2021, o material aqui apresentado serve como ponto de partida para se pensar a elaboração do orçamento de 2022.

2. Processo legislativo do orçamento público federal

O orçamento público federal é constituído por três leis complementares cuja tramitação está prevista entre os artigos 165 e 169 da Constituição Federal: o Plano Plurianual, a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA). As três são de iniciativa exclusiva do Poder Executivo, mas devem, obrigatoriamente, ser enviadas à Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização – a CMO – para serem apreciadas pelo Congresso. A CMO é composta por 30 deputados e 10 senadores, com igual número de suplentes, e comandada por um presidente e três vices, escolhidos anualmente na segunda quinzena de fevereiro, com possibilidade de extensão desse prazo até a primeira terça-feira de março. É importante mencionar que há subcomissões temáticas no âmbito da CMO que analisam os relatórios setoriais do orçamento, com prioridades e metas. Essas subcomissões aprofundam a discussão sobre investimentos, sendo espaços de potencial interlocução.

O Plano Plurianual tem vigência de quatro anos, do segundo ano do mandato presidencial em curso ao primeiro do mandato seguinte, sendo votado ao fim do primeiro ano de cada governo, após encaminhamento de sua proposta até 31 de agosto. As duas outras peças orçamentárias (LDO e LOA) são elaboradas anualmente, com o objetivo de, respectivamente, definir metas e diretrizes e autorizar gastos e investimentos.

Para monitoramento da atividade legislativa relativa ao orçamento, a LOA é a lei mais importante, pois é ela que prevê receitas e despesas e recepciona emendas parlamentares, individuais e de bancadas. Com a aprovação das emendas constitucionais 86 de 2015 e 100 de 2019, a execução de despesas previstas com emendas individuais e de bancadas se tornou obrigatória, salvo poucas exceções, até o limite, respectivamente, de 1,2% e 1% da receita líquida total do exercício anterior. Cada parlamentar pode apresentar individualmente até 25 emendas, enquanto cada bancada estadual pode apresentar até 23. Oito emendas, no máximo, também podem ser apresentadas pelo conjunto da Comissão.

A votação da LOA deve seguir a aprovação da LDO e, por isso, ela usualmente sofre atrasos, decorrentes de crises políticas ou de situações extraordinárias, não sendo raro, portanto, sua votação em março do ano de referência. É esse o caso da LOA de 2021, que apenas agora está sendo apreciada na CMO para emissão de parecer, inclusive sobre as emendas parlamentares. A votação final tanto da Lei, quanto das emendas, entretanto, é feita no plenário do Congresso.

As datas importantes na tramitação da LOA deste ano são as seguintes:

  • 10 fev – 1 março: prazo para apresentação de emendas à receita e despesa
  • 4 mar: votação do relatório preliminar e suas emendas
  • 5 mar – 14 mar: Publicação dos relatórios setoriais
  • 15 mar – 19 mar: Votação dos relatórios setoriais
  • 20 mar – 22 mar: Publicação do relatório geral
  • 23 mar: Votação do relatório geral
  • 24 mar: Votação em Plenário do relatório geral

Em relação aos relatórios setoriais e às emendas, as áreas temáticas de maior interesse para o objeto de análise deste relatório são a Área Temática IV, programa 5013 (educação superior), e Área Temática XI, o CNPq (2401).

3. Evolução das emendas orçamentárias: visão geral

De 2016 a 2020, o número de emendas individuais ao orçamento cresceu de forma contínua, saindo de 6.000 para 8.000. As exceções foram os anos de 2017 e 2020. Cada um dos 594[1] parlamentares em exercício apresentou, em média, pouco mais de 10 emendas individuais no curso desses anos. A proporção dessas emendas dedicadas às áreas de Educação e Ciência & Tecnologia (C&T) variou entre 8% e 14% do total, chegando ao seu ápice em 2020, quando uma em cada 7 emendas dos parlamentares tratou de um tema ou de outro.

As emendas de bancadas são apresentadas em menor número, segundo a regra vigente, mas, a partir de 2019, quando sua execução tornou-se também obrigatória, elas passaram a ter peso no orçamento semelhante ao das emendas individuais. Do ponto de vista temático, as bancadas estaduais dedicam à Educação e Ciência & Tecnologia proporção de emendas bastante similar àquela observada nas emendas propostas por cada parlamentar individualmente.

Gráfico 1. Número de Emendas por Tipo e Tema – escala natural

Gráfico 2. Número de Emendas por Tipo e Tema – escala logarítmica

Se observados os valores empenhados[2] na execução das emendas ao orçamento em cada ano, nota-se um crescimento de 363%, de cerca de R$7 bilhões em 2016 para aproximadamente R$33 bilhões em 2020. Os recursos destinados às áreas de Educação e C&T representam, em média, somente 6% e 1% da média do valor empenhado para todas as emendas nos últimos 5 anos, respectivamente.

Tabela 1. Valor empenhado em emendas parlamentares ao orçamento: 2016-2020

Ano

Valor total (R$)

Educação (R$)

C&T (R$)

Educação

C&T

2016

7.223.283.967,83

325.789.723,73

46.552.007,12

5%

1%

2017

10.704.235.747,00

387.194.424,56

177.817.545,46

4%

2%

2018

11.307.101.377,77

650.258.189,37

232.786.861,51

6%

2%

2019

12.973.770.235,32

1.323.165.160,14

105.873.231,01

10%

1%

2020

33.467.381.714,56

3.100.838.533,15

138.697.298,70

9%

0%

Média

11.307.101.377,77

650.258.189,37

138.697.298,70

6%

1%

A análise do número de emendas por partido, tanto na Câmara quanto no Senado, revela a importância do PT para os temas ora examinados. Deputados e senadores do partido apresentam grande volume de emendas nos dois temas, fato que não pode ser explicado, nas duas casas, e tampouco em todos os anos, exclusivamente pelo tamanho de suas bancadas.

Na Câmara, o número de emendas orçamentárias de parlamentares petistas cresceu sistematicamente de forma bastante expressiva a partir de 2018. O partido esteve na dianteira dos temas em todos os anos, seguido pelo PSDB, que perdeu a segunda posição em 2018 e 2020 para o MDB e para o PSB, respectivamente.

Em 2020, cabe observar que as três primeiras posições foram ocupadas por partidos à esquerda do campo político na Casa. O PSOL chama a atenção pela quantidade de emendas apresentadas frente ao tamanho de sua bancada. O gráfico abaixo demonstra o número de emendas apresentadas nessas áreas pelos oito partidos mais atuantes nos temas.

Gráfico 3. Emendas de Educação e C&T por Partido – Câmara dos Deputados

No Senado, a predominância das bancadas de esquerda é menos clara, a despeito de também nessa casa o PT ter tido posição de destaque até 2019. Enquanto os deputados federais apresentaram 30.395 emendas de 2016 a 2020, os senadores apresentaram 4.380. Ao longo desses cinco anos, a segunda posição de importância nos dois temas foi ocupada pelos seguintes partidos: PSB, Podemos e MDB.

Durante a gestão do presidente Bolsonaro, o MDB, que abriga a maior bancada da Casa, aumentou seus investimentos na área, ultrapassando o volume de emendas propostas pelo PT em 2020. Com a segunda bancada do Senado em 2020, o Podemos também cresceu em termos de volume de emendas no último ano, ocupando a segunda posição. Vale notar o desempenho negativo do DEM que, com bancada idêntica à do PT, apresentou ¼ das emendas dessa legenda para os temas Educação e C&T.

Gráfico 4. Emendas de Educação e C&T por Partido – Senado

As bancadas que apresentaram maior volume de emendas entre 2016 e 2020, por sua vez, foram as de Goiás e do Rio de Janeiro, com 9 emendas cada uma. No outro extremo, estão as bancadas de Alagoas, Pernambuco e Rio Grande do Sul, que levaram aos seus estados uma única emenda quando considerados os dois temas em conjunto. A explicação para o bom desempenho do Rio de Janeiro pode residir na ampla rede de instituições federais de ensino superior no estado, ao passo que causas prováveis para Goiás dependem de análise mais pormenorizada.

Gráfico 5. Emendas de Bancada de Educação e C&T – 2016-2020

4. Pontos de destaque

Este relatório apresentou um balanço inicial das emendas parlamentares para as áreas de Educação e C&T. A visão agregada revela padrões gerais que devem ser observados para o delineamento de novas análises. Um primeiro ponto a ser ressaltado é a concentração de parlamentares mobilizados nas referidas áreas temáticas em partidos de esquerda, notavelmente o PT e, a partir da atual legislatura na Câmara dos Deputados, PSOL e PSB. Esse cenário revela uma boa porta de entrada para a incidência parlamentar, mas ao mesmo tempo expõe o limite a ser enfrentado: é importante aumentar a interlocução com outros campos políticos, inclusive mapear quais parlamentares de outros partidos engajam-se ou têm potencial para se engajar no tema é caminho a ser explorado.

Um segundo ponto que deve ser desenvolvido é a sensibilidade de bancadas estaduais aos interesses do ensino superior. O bom desempenho do Rio de Janeiro sinaliza que redes de instituições federais podem ser melhor aproveitadas em outras unidades federativas. Novamente aqui, um olhar atento a bancadas e emendas pode ajudar na elaboração de estratégias de médio prazo.

[1] O número é maior que as 513 cadeiras porque deputados frequentemente assumem postos no executivo federal ou se elegem prefeitos durante seus mandatos, sendo assim substituídos no posto.

[2] O empenho do recurso significa que houve programação, por parte do governo, para realização daquele investimento. Optou-se, neste relatório, por usar os valores empenhados, em detrimento de valores liquidados e valores pagos, com o objetivo de comparar os recursos propostos por tipo de emenda e tema. Isso porque as regras vigentes para as emendas orçamentárias garantem a obrigatoriedade de sua execução, mas não definem prazo para que essa execução aconteça. A decisão fica a cargo do Planalto. Nesse sentido, a comparação entre valores liquidados e pagos, ainda que muito importante para análise, por exemplo, do uso das emendas como instrumento de manejo de coalizões, cumpre objetivo distinto do que se pretende neste estudo.

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