Negros estão sub-representados em posições de liderança na Câmara dos Deputados

Postado por OLB em 25/11/19

Em matérias que dependem apenas de iniciativa individual, desempenho é melhor ou igual ao dos autodeclarados brancos

Como estão atuando as Deputadas e Deputados Federais negros (pretos e pardos) nessa nova legislatura? Usando a autodeclaração de identidade racial, fornecida pelos candidatos ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no momento de seu registro para o pleito de 2018, o Observatório do Legislativo Brasileiro (OLB) avaliou as métricas de produção legislativa dos congressistas em 2019, primeiro ano da atual legislatura. Considerando os parlamentares titulares e os suplentes que exerceram mandato na Câmara até o momento, são 407 aqueles que se autodeclaram brancos, 2 que se autodeclaram amarelos, 109 pardos, 22 pretos e um indígena.

O resultado da análise mostra que em atividades que dependem apenas de iniciativa individual, parlamentares negros têm desempenho melhor ou igual ao dos brancos. No gráfico abaixo, em que foi calculado a média de projetos de leis introduzidos por deputadas e deputados, é possível observar que os pretos obtiveram 8,7, praticamente empatados com os brancos, com 8,8. Já os parlamentares pardos apresentaram uma média de projetos ligeiramente maior, 9,2.

No quesito emendas a proposições verificamos dinâmica semelhante, com a média de brancos e pardos praticamente igual, 153 e 156, respectivamente, e média de emendas de pretos significativamente maior, 196.

Ao se analisar a apresentação de requerimentos de informação, a atividade de pretos e pardos é ligeiramente superior à de parlamentares brancos. Esse tipo de proposição é muitas vezes utilizado por parlamentares para terem acesso a dados do governo e podem, assim, indicar atuação em favor de maior transparência do Estado e de suas políticas públicas. Nesse quesito, observa-se na atual legislatura uma média de 5.5 requerimentos de parlamentares pretos, 4 requerimentos para pardos, e apenas 3.3 para os brancos, conforme o gráfico abaixo.

O relativo equilíbrio verificado acima entre os grupos de raça não se reproduz quando a participação de parlamentares não depende exclusivamente de iniciativa individual, mas sim da intermediação de partidos e lideranças. É o caso, por exemplo, das indicações de relatorias.

Todas as proposições de lei devem passar por comissões temáticas no curso de sua tramitação, onde são avaliadas, possivelmente alteradas e votadas antes de chegar ao Plenário. Quando um projeto de lei é enviado a uma comissão, o presidente daquela comissão nomeia relator, que é responsável por produzir o parecer (relatório) que será ao final votado pelos pares da comissão. Os parlamentares responsáveis por produzir relatórios sobre proposições de lei podem favorecer (ou atrapalhar) a tramitação de um projeto, bem como direcioná-lo. Ou seja, a posição de relator é estratégica e sua indicação cabe a alguém em posição de poder na estrutura partidária do parlamento.

Esses dados refletem, em parte, a própria composição das comissões na Câmara dos Deputados, a qual também depende de indicações de lideranças de bancada. Em comissões centrais na Câmara dos Deputados, como a Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania (CCJC) e a Comissão de Finanças e Tributação (CFT), que avaliam respectivamente a constitucionalidade das proposições e sua adequação financeira, há representação ínfima dos parlamentares negros. Por exemplo, na CCJC, há apenas um parlamentar dentre os 22 que se autodeclararam pretos. Das comissões consideradas mais importantes, apenas a Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF), responsável pela proposições ligadas à área social, verifica-se representação de parlamentares negros um pouco mais significativa.

Esses dados apontam para o fato de que a população negra do Brasil, como já é fato conhecido, não apenas está sub-representada no Congresso de forma geral como, no âmbito da Câmara dos Deputados, seus representantes têm menor acesso a posições estratégicas, em larga medida controladas pelas lideranças. Nossos dados não nos permitem examinar as causas dessa dupla discriminação. Elas certamente são complexas e dizem devem estar relacionadas tanto aos processos eleitorais-partidários como às dinâmicas internas à Câmara dos Deputados. Por outro lado, não precisamos ter um conhecimento perfeito e profundo das causas para criar mecanismos para mitigar tamanha desigualdade.

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