Parlamentares mais influentes na Câmara dos Deputados atuam de forma positiva ou negativa frente ao meio ambiente?

Postado por OLB em 02/02/23

Joyce Luz, João Feres Jr., Júlio Canello e Maiane Bittencourt

Apresentação

Quão influentes institucionalmente são os Deputados Federais brasileiros e o que podemos esperar dos reeleitos para a legislatura que terá início no próximo ano? Como os parlamentares mais influentes no processo legislativo atuaram em uma das áreas mais sensíveis da atual agenda pública: a preservação do meio ambiente e a mitigação das mudanças climáticas? Essas são algumas das questões que o Observatório do Legislativo (OLB) busca responder neste boletim.

A ferramenta utilizada para isso é o Índice de Influência Parlamentar (INF), recentemente desenvolvida pelo OLB, que tem como propósito principal avaliar o grau de influência de cada deputado federal no processo legislativo, tomando como base os cargos e posições institucionais que eles ocupam e ocuparam no interior da Câmara dos Deputados. De posse desse indicador, avaliamos a atual composição do Legislativo buscando entender, em um primeiro momento, quais parlamentares da nova legislatura terão potencialmente maior influência no processo decisório.

Motivados pela atuação catastrófica do governo passado no que toca à preservação do meio ambiente e às mudanças climáticas, decidimos olhar para quem e quão influentes foram os deputados atuantes nos projetos sobre esses temas que passaram pela Casa. Para produzirmos uma análise mais robusta, combinamos aos INF dados do Ranking de Mudanças Climáticas e o Índice de Ativismo da Tribuna (IAT) – também criados pelos OLB –, que agregam outros dados da atuação parlamentar, como diferentes ações ao longo do processo legislativo e discursos de tribuna. Assim, neste relatório será possível analisar a influência do parlamentar, seu interesse e seu engajamento no tema.

1. O Índice de Influência Parlamentar

O Índice de Influência Parlamentar (INF) tem por objetivo principal classificar os deputados federais brasileiros mais influentes e menos influentes do ponto de vista da tramitação legislativa e de sua posição institucional atual e passada. Por meio de um sistema de pontuação, o índice considera todos os cargos e posições institucionais importantes que o parlamentar ocupa atualmente e que já ocupou no passado, desde a 51ª legislatura, em 1999,  classificando os representantes de acordo com uma escala que vai de 0 a 10. Quanto maior a nota, mais importantes são os cargos ocupados pelo parlamentar no arcabouço institucional do processo legislativo.

Para a construção do indicador, consideramos as seguintes posições institucionais ocupadas pelos deputados desde 1999: presidente da mesa diretora; líder do governo; líder da maioria; líder do partido; presidente da Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania (CCJC); presidente da Comissão Mista de Orçamento (CMO); presidente de Comissões Permanentes; líder da oposição; líder da minoria; presidente da Coordenadoria dos Direitos das Mulheres (CDM); relatorias da CMO e relatorias de projetos de lei, de lei complementar, medidas provisória e propostas de emenda à Constituição que tramitaram na atual legislatura. A pontuação atribuída a esses cargos e posições segue uma ordem de importância e considera, nos casos necessários, os pesos das bancadas partidárias, bem como do total de deputados federais em exercício e da composição da respectiva Comissão em análise. Também consideramos o efeito da ocupação de cargos e posições em legislaturas passadas, que tem valor menor quanto mais remota for a legislatura.

Neste boletim, empregamos o Índice de Influência parlamentar com ênfase no tema do meio ambiente e das mudanças climáticas. Trata-se de um caso especial do indicador geral, no qual as presidências e relatorias de comissões permanentes dedicadas a essa temática ambiental ganham uma pontuação adicional Também incluímos no cálculo as presidências de subcomissões e comissões especiais voltadas a essa agenda.

2. Influência parlamentar e deputados reeleitos

Para a legislatura de 2023, a média do INF para aqueles parlamentares reeleitos é quase duas vezes maior do que a média daqueles que não concorreram à reeleição ou que não foram reeleitos. Em certa medida, essa diferença nos sugere que ocupar cargos de poder no interior da Câmara dos Deputados traz retorno eleitoral – ainda que estudos mais aprofundados e outros testes empíricos precisem ser realizados para confirmar essa hipótese.

Gráfico 1. Média do INF de deputados reeleitos X não reeleitos

Fonte: Observatório do Legislativo Brasileiro.

Entre os 10 deputados federais mais influentes desta última legislatura, Arthur Lira (PP-AL) aparece na liderança com a pontuação máxima que pode ser atribuída pelo INF, o que era esperado. Desde que assumiu a presidência da Câmara dos Deputados em 2021, Lira usou estrategicamente as prerrogativas de seu cargo para influenciar não só a pauta legislativa, como também importantes votações. Além de ser o atual presidente da casa, o parlamentar também pontua em razão de sua experiência prévia, seja na presidência da CCJC, da CMO, ou como líder partidário. Em seguida, aparece Elmar Nascimento (União Brasil-BA), reconhecido por ser o líder de seu partido na Câmara e por ter sido o relator da Proposta de Emenda à Constituição “PEC da Transição”.

Tabela 1. Lista dos 10 parlamentares mais influentes no interior da Câmara dos Deputados (2019-2022)

Fonte: Observatório do Legislativo Brasileiro.

Dos 10 parlamentares mais influentes, percebemos que a maior parte compõe partidos do Centrão (4 do União, 2 do PP e 1 PL). Os casos dissonantes do Centrão são Rodrigo Maia, ex-presidente da Casa e ex-integrante do antigo DEM (fundido com o PSL para se tornar o atual União Brasil), que fazia parte do bloco, mas migrou para a sigla tucana em 2021; e André Figueiredo, parlamentar menos conhecido no jogo político.

Por mais que nenhuma mulher apareça entre os 10 mais influentes, quando olhamos a distribuição dos INFs de toda a legislatura, as diferenças de gênero são pouco significativas. Com índice médio para homens de 0,64 e para mulheres de 0,58, a maioria dos deputados e deputadas permanece no espectro da pontuação que vai de valores próximos a zero a 5, ou seja, de influência baixa a mediana.

Gráfico 2. Distribuição do INF por gênero

Fonte: Observatório do Legislativo Brasileiro.

Na distribuição do INF por partidos, alguns resultados são dignos de nota. O primeiro deles é o de que as siglas que mais apoiaram a gestão do presidente Jair Bolsonaro (PL) no interior da Câmara dos Deputados são justamente as que apresentam deputados mais influentes – com INFs mais altos. Os destaques são o PP e a União Brasil. Para os demais partidos é possível observar que há sempre alguns poucos parlamentares mais influentes, enquanto a maioria dos membros permanece no espectro próximo de zero, ou seja, no nível de baixa influência.

Gráfico 3. Distribuição do INF por partido

Fonte: Observatório do Legislativo Brasileiro.

A diferença entre o INF médio dos deputados ligados ao Centrão, grupo de parlamentares reconhecidos por apoiar o governo em troca de benefícios, e os demais deputados também não é significativa – a média do Centrão é de 0,62 frente à 0,65 do agregado dos outros partidos políticos. Tal como a distribuição geral dos parlamentares, há poucos deputados do centrão que são mais influentes ou que apresentam influência mediana, ao passo que a concentração da maioria dos parlamentares do grupo permanece na região de baixa influência.

Gráfico 4. Distribuição do INF Centrão X outros partidos

Fonte: Observatório do Legislativo Brasileiro.

3. Mapeando os atores: como influência parlamentar e engajamento na agenda de mudanças climáticas se relacionaram na última legislatura

Para compreender melhor a influência dos parlamentares relacionada ao tema das mudanças climáticas, o OLB cruzou a pontuação do INF com o ranking de mudanças climáticas e com o Índice de Ativismo da Tribuna (IAT) para o tema do meio ambiente. No gráfico 5, cada ponto colorido representa um parlamentar que foi reeleito (ponto rosa) ou não eleito (ponto azul). O tamanho do ponto representa o IAT, que mede o quanto o parlamentar discursou sobre o tema ao longo da legislatura. Enquanto o eixo y (vertical) representa o INF, ou seja, o quanto o parlamentar é influente na Câmara dos Deputados, o eixo x (horizontal) representa o ranking de mudanças climáticas que, por sua vez, indica o quanto o parlamentar esteve engajado positivamente ou negativamente em projetos relevantes relacionados ao tema.

Chama a atenção que há uma concentração significativa de parlamentares que foram reeleitos, que possuem uma influência mediana (INF próximo a 5), mas que não tratam tanto da questão do meio ambiente em seus discursos, mas que atuaram de forma contrária em projetos relevantes ao tema das mudanças climáticas (ranking negativo). E mais: para 2023, não teremos nenhum parlamentar eleito que tenha uma influência maior que 5 e que tenha atuado ao longo desta legislatura de forma positiva para o tema das mudanças climáticas.

Gráfico 5. Influência Institucional, engajamento e ranking em mudanças climáticas – 56ª Legislatura

Fonte: Observatório do Legislativo Brasileiro.

Em um olhar mais detalhado, o grupo de deputados que possuem uma influência institucional mediana, que foram reeleitos, mas que atuaram de forma contrária ao tema das mudanças climáticas, contém 8 representantes. São eles os principais parlamentares aliados ao governo que se encerrou e às suas pautas conservadoras. No outro espectro, qual seja, o de deputados influentes reeleitos e que atuaram de forma positiva na pauta das mudanças climáticas, estão importantes nomes opositores ao governo Bolsonaro, como André Figueiredo (PDT), Reginaldo Lopes (PT) e Paulo Pimenta (PT).

Gráfico 6. Deputados Federais com INF mediano, engajamento em mudanças climáticas e ranking – 56ª Legislatura

Fonte:Observatório do Legislativo Brasileiro.

4. Amazônia Legal, comissões de destaque e frentes parlamentares

Para um recorte ainda mais específico, também olhamos para o nível de influência institucional e para o padrão de engajamento dos deputados reeleitos de estados da  Amazônia Legal, para os deputados que são membros titulares da Comissão de Meio Ambiente e para os deputados que são membros da Comissão  de Agricultura.

Dentre os 40 deputados federais que foram reeleitos e pertencem a Amazônia Legal, 33 apresentaram engajamento negativo em projetos relevantes ao tema das mudanças climáticas. Dois deles, André Fufuca (PP) e Celso Sabino  (União Brasil), preocupam, pois para além da atuação contrária no tema, ainda são parlamentares com relevante influência dentro da Câmara dos Deputados. Por outro lado, os parlamentares que se engajaram positivamente no tema somam apenas 3 e possuem uma baixa influência institucional.

Gráfico 7. Influência Institucional e engajamento em mudanças climáticas para os deputados reeleitos da Amazônia Legal

Fonte: Observatório do Legislativo Brasileiro.

Na Comissão de Meio Ambiente, chama a atenção o fato de que 8 dos 11 membros reeleitos tenham engajamento negativo no tema das mudanças climáticas. Ainda no interior deste grupo, o deputado Covatti Filho (PP), presidente da comissão, possui uma influência institucional mediana com pontuação próxima a 5, isso é, para além de ter um engajamento contrário à pauta da mudança climática, o parlamentar ainda possui influência significativa no legislativo. Outros 3 deputados com engajamento negativo também não podem ser desconsiderados: Carlos Gomes (Republicanos), Diego Garcia (Republicanos) e Zé Vitor (PL). Seu INF é muito próximo ao INF alcançado por Nilto Tatto (PT), único parlamentar da comissão que apresenta engajamento positivo e uma influência maior que 2,5 pontos.

Gráfico 8. Influência Institucional e engajamento em mudanças climáticas para os deputados reeleitos da Comissão de Meio Ambiente

Fonte: Observatório do Legislativo Brasileiro.

Na comissão de Agricultura e Pecuária o cenário é ainda mais preocupante. Entre os 25 deputados reeleitos, 18 tiveram atuação contrária em projetos relevantes ao tema das mudanças climáticas na atual legislatura, enquanto apenas 7 apresentaram atuação favorável. O que chama mais a atenção é que, entre os 18 parlamentares que são avessos ao tema, 3 possuem influência institucional que merece atenção, superior a 2,5 pontos, com destaque para o presidente da comissão, deputado Giacobo (PL). Já entre os 7 parlamentares defensores da pauta, nenhum apresenta INF maior que 1, ou seja, são pouco influentes no interior da Câmara dos Deputados.

Gráfico 9. Influência Institucional e engajamento em mudanças climáticas para os deputados reeleitos da Comissão de Agricultura e Pecuária

Fonte: Observatório do Legislativo Brasileiro.

Por fim, analisamos a atuação e engajamento dos deputados federais reeleitos que integram a Frente Parlamentar Ambientalista e a Frente Parlamentar da Agropecuária. Do total de 89 deputados que integram pelo menos uma dessas frentes, 70 apresentam engajamento contrário ao tema das mudanças climáticas. Dentro desse grupo de parlamentares, Arthur Lira (PP), atual presidente da Câmara dos Deputados, aparece como o mais influente no jogo político, seguido pelo deputado Antônio Brito (PSD), com uma influência significativa de 5,33 pontos. Ainda não é possível desconsiderar aqui a influência mediana que atores que estão em ambas as frentes, como Ricardo Barros (PP), Altineu Côrtes (PL), Arthur Oliveira Maia (União Brasil), Evair Vieira de Melo (PP) e Diego Andrade (PSD), possuem.

O grupo de parlamentares que possuem engajamento positivo no tema das mudanças climáticas e que pertencem a ambas frentes parlamentares é composto por apenas 17 parlamentares. Nenhum deles ultrapassa os 5 pontos de influência institucional. Somente Reginaldo Lopes (PT) e Paulo Pimenta (PT) destoam dos demais deputados e apresentam INF de aproximadamente 3,80.

Essa configuração, que enfatiza parlamentares que integram ambas as frentes, releva aspectos do funcionamento das frentes parlamentares que merecem atenção e aprofundamento de análise. Primeiro, frentes que poderiam parecer opostas a uma primeira vista, contam com um conjunto importante de membros em comum, minimizando supostas barreiras temáticas ou regiões de conflitos e oposições. Segundo, o simples pertencimento nominal de um parlamentar a determinada frente diz pouco acerca de seu engajamento no tema da frente ou de sua influência na Casa. Os resultados são elucidativos: existe um grupo expressivo de deputados que integram a Frente Parlamentar Ambientalista, mas que atuaram negativamente em projetos relevantes à agenda de mudanças climáticas que tramitaram na última legislatura.

Gráfico 10. Influência Institucional e engajamento em mudanças climáticas de deputados reeleitos que integram a Frente Parlamentar Ambientalista e a Frente Parlamentar da Agropecuária

Fonte: Observatório do Legislativo Brasileiro.

A análise feita neste Boletim é baseada em um olhar retrospectivo, ou seja, nos comportamentos observados na legislatura passada. Com a renovação das composições das comissões e com a maior visibilidade que os temas do meio ambiente e das mudanças climáticas devem ter no governo que ora se inicia, alterações significativas devem ocorrer. Por outro lado, mais da metade dos deputados da legislatura passada foram reeleitos e o perfil da Câmara continuará bastante conservador.

Pontos de destaque

  • Entre parlamentares os mais influentes, deputados do Centrão protagonizam mesmo que o INF do bloco não tenha diferença significativa em relação aos dos demais parlamentares.
  • Mulheres não estão ranqueadas entre os parlamentares mais influentes, apesar do INF médio não apresentar diferença significativa de gênero.
  • A maioria dos deputados e deputadas permanece no espectro da pontuação que vai de valores próximos a zero no INF, de baixa influência, até o a nota 5, que representa uma influência mediana. Esse resultado sugere não somente que a ocupação de cargos e posições de influência no processo legislativo é um recurso escasso, mas também que a ocupação desses espaços é concentrada em poucos representantes ao longo do tempo.
  • As siglas que mais apoiaram a gestão do presidente Jair Bolsonaro (PL) no interior da Câmara dos Deputados são justamente as que apresentam deputados mais influentes – com notas mais altas para o INF – , com destaque para o PP e para o  União Brasil.
  • Em 2023, não teremos nenhum parlamentar reeleito que tenha uma influência maior que 5 e que tenha atuado ao longo desta legislatura de forma positiva no tema das mudanças climáticas. Ou seja, parlamentares mais influentes atuaram em agendas mais conservadoras e de forma negativa ao meio ambiente.
  • Na Amazônia Legal, na Comissão de Meio Ambiente e na Comissão de Agricultura, predominam, entre os parlamentares mais influentes reeleitos, aqueles que atuaram negativamente nas pautas ambientais.
  • O simples pertencimento à Frente Parlamentar Ambientalista e/ou à Frente da Agropecuária informa pouco sobre o nível de influência do representante e sobre seu engajamento em projetos relevantes aos temas das respectivas frentes.
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